sexta-feira, 3 de fevereiro de 2023

Ser ou não ser feliz na escola – eis a questão

Ouvi dizer que as crianças e os alunos e as alunas do nosso agrupamento não são felizes na escola. Ouvi falar de uma onda avassaladora e preocupante de infelicidade.
Parto do princípio que esta afirmação assenta em dados concretos e que, sendo assim, há que mudar rapidamente as estratégias do agrupamento no sentido de promover a felicidade.
Deixo uma reflexão pessoal sobre a questão da felicidade.
Em primeiro lugar, o que é ser feliz?
Pois, começa aí a divergência ou a convergência.
Podia transcrever a definição da OMS, mas é demasiado rebuscada para o meu gosto.
Ser feliz, na minha opinião, é simplesmente estar confortável, sentir-se bem e integrado... usufruir dos espaços escolares, ser acolhido, sentir-se parte importante de um coletivo. É retribuir o bom dia e sorrir, é queixar-se a quem de direito, é expressar os sentimentos e as emoções, é ser ouvido, é poder chorar e rir. É poder estar triste e contente. É poder contar com alguém para um abraço.
Em segundo lugar, por que razão algumas crianças não se sentem felizes no espaço escolar?
O espaço escolar assegura um serviço público que, como qualquer outro espaço público, está regulado por um código de conduta que deve ser respeitado por quem o frequenta.
De onde pode vir, então, essa sensação de infelicidade?
Em casa as regras são diferentes? Não existe a promoção de gestos solidários, de condutas sustentáveis sobre os recursos do planeta, sobre alimentação saudável?
Se uma criança estiver exposta a uma alimentação desequilibrada, hábitos de consumo questionáveis, sem regras de comportamento social, regras de higiene que põem em risco a saúde... vai confrontar-se com uma realidade oposta na escola e isso será, obviamente, um fator de desilusão, de infelicidade.
Nessas condições, eu também não quereria ir para a escola. Sair da zona de conforto é desagradável e, por vezes doloroso.
A escola pode e deve sinalizar todas as situações de risco, nas diversas vertentes, mas não tem meios, nem competência, para agir sobre o perfil das famílias e para o modificar.
Sempre que é imputada à escola a resolução de problemas que não são da sua competência, é um erro crasso, que não resolve nenhuma situação e cria nas famílias a expetativa de que o sistema educativo tudo resolve ou deveria resolver.
A escola deveria ser um espaço inclusivo e de proteção. Deveria! Mas só o poderá ser quando a mesma for dotada dos meios, em termos de recursos físicos e humanos, que garanta essa inclusão. E estou a falar apenas do processo de ensino e de aprendizagem, porque a parte social e de resolução dos problemas graves que muitas famílias enfrentam (desemprego, baixos salários, más condições de habitação, endividamento...) não são competência da escola. Sim, a escola oferece o lanche da manhã, uma refeição quente à hora do almoço e o lanche da tarde às crianças dos jardins de infância e aos alunos do 1º ciclo. Não entrega o jantar quente em casa dos estudantes? Não, ainda não. Entretanto, questiona-se a ementa do refeitório, supervisionada por nutricionistas?
Por isso, associações de pais, foquem-se no que é importante e sejam assertivas no que condiciona a felicidade dos educandos e das educandas dos vossos e das vossas associados(as). O problema não está na escola. O problema é muito mais complexo e a escola procura, e no caso do nosso Agrupamento, faz de tudo, para minorar, mas não tem condições, nem competência para o resolver.
A felicidade não se alcança com ações de “building team”. Primeiro, porque são dirigidas para quem tem já consciência de todas estas variáveis e, segundo, porque o menor ou maior índice de felicidade das nossas crianças e jovens se decide e se constrói diariamente nas salas de aula, com os professores e as professoras, e nos espaços de recreio com o apoio dos e das Assistentes Operacionais.
Ser feliz na escola? Acredito sinceramente que muitas das crianças e jovens, que nos preocupam em termos sociais, são mais felizes na escola do que em casa.
Se as nossas crianças disserem que gostam dos recreios e que estes são a melhor parte do dia escolar, significa que são felizes. Se disserem o contrário, é porque a escola está errada e temos de rever tudo. Dispostos a fazer um questionário muito simples de avaliação?

Salomé Correia, docente do Agrupamento de Escolas da Lousã

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