Placard Escola Secundária da Lousã; Foto: Luís Moura
Placard Escola Secundária da Lousã; Foto: Luís Moura
Placard Escola Secundária da Lousã; Foto: Luís Moura
O 46º poema, Tourada, de José Carlos Ary dos Santos, é uma canção, com música e interpretação de Fernando Tordo, que foi feita para o Festival da Canção de 1973 e que venceu, tendo representado Portugal no Festival da Eurovisão, no Luxemburgo, onde ficou em 10º lugar. Com uma linguagem metafórica, representa uma crítica social, política mordaz ao regime e ditadura salazarista e fascista, tendo conseguido iludir e escapar à censura de então, o que deixou os seus autores muito surpreendidos. Esta canção, ousada e diferente para a época, ainda a Revolução do 25 de Abril não tinha chegado, fez história e ficou para sempre na memória. É um poema de 1973 e que pretendia retratar o Portugal dessa época, mas é intemporal e sempre atual. Por exemplo, os versos «Com bandarilhas de esperança/Afugentamos a fera/Estamos na praça/Da Primavera./Nós vamos pegar o mundo/Pelos cornos da desgraça/E fazermos da tristeza/Graça» faziam todo o sentido então, antes do 25 de Abril, mas também o fazem agora e sempre farão, pois é necessário “tourear” «ombro a ombro/As feras» e «pegar o mundo/Pelos cornos da desgraça/E fazermos da tristeza/Graça».
Luís Moura, docente de Português
46. Tourada
Não importa sol ou sombra
Camarotes ou barreiras
Toureamos ombro a ombro
As feras.
Ninguém nos leva ao engano
Toureamos mano a mano
Só nos podem causar dano
Espera.
Entram guizos chocas e capotes
E mantilhas pretas
Entram espadas chifres e derrotes
E alguns poetas
Entram bravos cravos e dichotes
Porque tudo o mais
São tretas.
Entram vacas depois dos forcados
Que não pegam nada.
Soam brados e olés dos nabos
Que não pagam nada
E só ficam os peões de brega
Cuja profissão
Não pega.
Com bandarilhas de esperança
Afugentamos a fera
Estamos na praça
Da Primavera.
Nós vamos pegar o mundo
Pelos cornos da desgraça
E fazermos da tristeza
Graça.
Entram velhas doidas e turistas
Entram excursões
Entram benefícios e cronistas
Entram aldrabões
Entram marialvas e coristas
Entram galifões
De crista.
Entram cavaleiros à garupa
Do seu heroísmo
Entra aquela música maluca
Do passodoblismo
Entra a aficionada e a caduca
Mais o snobismo
E cismo...
Entram empresários moralistas
Entram frustrações
Entram antiquários e fadistas
E contradições
E entra muito dólar muita gente
Que dá lucro aos milhões.
E diz o inteligente
Que acabaram as canções.
José Carlos Ary dos Santos, 1972
Sem comentários:
Enviar um comentário